segunda-feira, 29 de setembro de 2008

CRÓNICA DE PARIS - pt. II

Alguns amigos estranharam eu ter representado o Canadá em vez de Portugal. Não que tenha emigrado e que tenha trocado o meu país (até porque apenas sou residente e não cidadão). Portugal continua e continuará a ser o meu país. É certo que me mantive em contacto directo com os corpos directivos da FPS e tentei ver se era possível efectuar o campeonato nacional enquanto eu estivesse em Portugal. Não que eu estivesse à espera que marcassem uma data por causa de mim, mas devido à altura em que foi (eu estive em Portugal de 2 de Maio a 8 de Junho) e ao tempo que lá permaneci, pensei que talvez tivesse hipóteses. A justificação que ouvi foi que era demasiado em cima da hora. Ouvi e compreendi perfeitamente. Estava sem sorte. O campeonato seria realizado a 14 de Junho, no Porto....

...seria porque não foi. Foi adiado para 19 de Julho, igualmente no Porto, porque apenas havia atletas para as categorias de 60-65kg e de 65-70kg, se a memória não me falha. Em data próxima do encontro agendado, por bom senso e sugestão do Joaquim Ferreira e que acabou por ser mais ou menos unânime, não se iria realizar um campeonato. Ora isto é um caso grave e sobre o qual temos de reflectir todos sem excepção. Refiro-me à indisponibilidade das pessoas para se encontrarem, no mínimo, para um campeonato nacional (pois idealmente deveria haver pelo menos alguns estágios e encontros amigáveis durante o ano).

Foi, portanto, com grande estranheza quando me contaram que NÃO houve campeonato nacional para apuramento dos atletas que iriam aos mundiais! Eu também só sei destas notícias com um certo desfasamento de tempo, devido à distância.

Planeei a minha viagem para estar alguns dias em Portugal antes de ir para Paris, para poder ver os amigos/família, mas também para ir na companhia da equipa portuguesa, com quem me identifico, ao invés de ir com os meus colegas canadianos. Portanto, a única coisa que não tratei foi do vôo para Paris, delegando na minha irmã essa função, para poder conjugar as datas afim de irmos todos juntos.

Eis que o tempo passa e a minha irmã que esteve comigo aqui nas férias até meados de Agosto, regressa a Portugal e eu começo a estranhar a demora na compra dos bilhetes. E quanto mais tempo passa, mais caros os bilhetes se tornam. É assim que as companhias aéreas ganham dinheiro (para além de não darem refeições em viagens curtas... Oiçam bem o que vos digo, esse vai ser o próximo passo da TAP). Até que se atinge a um ponto em que concluímos que não é possível esperar mais para haver uma tentativa de conjugação de datas e a Sara compra os bilhetes para mim (atleta), para ela (atleta) e para o Ricardo (massagista).

Compreendo que todas as federações tenham desavenças e que as pessoas tenham contratempos a nível pessoal, acrescendo ainda o facto de o desporto ser amador e de cada pessoa normalmente não ter a sorte de arranjar patrocínios e, logo, ter de pagar tudo do seu bolso. Porém, parece que estamos na quinta dimensão porque tudo aconteceu ao mesmo tempo, senão analisemos com cuidado:

A norte do Tejo:
*núcleo de Caminha: em Maio o Leonel Soares (e provável candidato a atirador na categoria de 80-85kg) foi contactado pela presidente, expressando o interesse de dois atletas, sendo que depois deixou de responder aos emails. Que se terá passado?

*o núcleo do Porto, na pessoa do Joaquim Ferreira (e o candidato mais provável a atirador na categoria de 75-80kg), foi também contactado telefonicamente em diversas ocasiões, a partir do final de Julho. Em nenhuma delas se estabeleceu a chamada, nem houve qualquer retribuição da mesma ou envio de qualquer mensagem. As férias podiam ter sido uma possível justificação, mas estamos já em finais de Setembro e até agora não houve qualquer mostra de interesse, nem como nenhuma comunicação.

*o núcleo de Felgueiras, por intermédio do Paulo Silva, terá informado o Álvaro Terezo (em que altura não sei, mas terá sido atempadamente presumo) que não iria a França, tendo o Álvaro comunicado isto à Sara em Agosto.

A sul do Tejo (e devido à proximidade, por atletas à excepção de Oeiras):
*o núcleo de Oeiras, representado pelo Francisco Abreu, em data que não consegui apurar, comunicou a indisponibilidade na participação no campeonato do mundo.

*núcleo de Sintra: permitam-me aqui uma análise mais cuidada, mas como expliquei acima, trata-se de pessoas que conheço bem:

-Nelson Vicente (+85kg): não consigo compreender de todo a atitude do Nelson. Estava motivado, andou a treinar bem nas férias, perdeu peso para se tornar ainda mais rápido e depois, muito próximo do evento, oiço-lhe motivos que sugerem alguma indecisão por se encontrar mais virado para a vertente de combat. Na 3ª feira, dia 16 de Setembro (note-se que o campeonato começou a 18 com as pesagens), o Nelson estava já decidido a não ir porque tinha uma multa avultada para pagar.

-Miguel Cardador (80-85kg): levantou-se a hipótese remota do Miguel preencher esta categoria, uma vez que havia um silêncio por parte do Leonel. Não obstante, desde cedo que o Miguel avisou que o mais provável seria não poder ir por questões financeiras.

-Patrick Mendes (65-70kg) fez saber ainda no mês de Julho que não teria possibilidade de ingressar como atleta.

-André Saraiva (60-65kg) terá respondido somente no final de Agosto que não poderia ir por motivos económicos e por não se encontrar fisicamente preparado.

-Sara Flores (65-70kg) foi a única atleta que efectivamente se deslocou a França para participar no campeonato do mundo.

-Álvaro Terezo (treinador) confirmou à última hora (16 de Setembro) que não poderia comparecer, apesar de antes ter comentado com o António, em Agosto, que por motivos profissionais e pessoais, talvez não conseguisse estar disponível para o efeito.

-António Timóteo (treinador) ao ver a reduzida adesão decidiu, ao que me parece, também na 3ª feira, dia 16 de Setembro, não ir.

Resumindo e baralhando: a delegação portuguesa com potencialmente uma dezena de pessoas (não havia oficiais previstos), acabou por apresentar DUAS pessoas: uma atleta e um massagista.

Isto leva-me a perguntar: teve toda a gente um tal azar e/ou falta de condições, o que lhes causou a indisponibilidade para se deslocarem a França, ou há, na verdade, uma incúria e um torpor latente por parte das pessoas, esperando, na melhor das hipóteses, que haja outros a cobrir ou seu lugar ou, na pior das hipóteses, não se importando de todo com o que se vai passar?

Muito espantados ficaram Joel Dhumez e Gilles Le Duigou ao saberem que de Portugal tinha ido apenas uma atleta, facto que evidencia uma discrepância brutal face à inscrição de atletas apenas algumas semanas antes.

Mais grave ainda é haver um corpo legal subjacente ao gosto pelo boxe francês, consumado numa federação e que, com efeito, não me parece que esteja a crescer. Muito pelo contrário. Observando num espectro mais alargado: será por se tratar de um desporto amador e de não trazer dividendos que as pessoas não estão dispostas a dispender parte do seu tempo para a FPS? É um espírito voluntário, mas que é crítico em especial quando a federação acabou de ser criada. Obviamente que este comentário não é em resultado da análise particular que acabei de fazer. É fruto de uma ponderação de ideias onde se nota que salvo uma altura do ano (a do campeonato que determina as pessoas que vão às competições [que este ano, como sabemos, não se realizou]), não há praticamente comunicação entre os vários núcleos onde se lecciona o boxe francês.

Não posso deixar de relembrar os esforços voluntários do Pedro Glória, ao organizar estágios com os diversos grupos, mas isso não chega. Precisamos de mais. E podemos ter mais. Ainda há dias em conversa com o Joel Dhumez, ele me disse que tem disponibilidade de enviar duas a três pessoas a Portugal para nos dar formação, quer para atletas, como também para acreditar pessoas para serem futuros juizes/árbitros. É só uma questão de arranjar um patrocínio que consiga proporcionar a estas visitas, tal como no passado a Joel Dhumez (por duas vezes), a Vitor Sebastião e a Gerhard Schmitt, alojamento e pensão. Há, por outro lado, a hipótese do intercâmbio/estágio de atletas de outras federações. Ainda este ano os meus vizinhos americanos convidaram os belgas para um estágio e ao que parece a coisa correu bem.

É este intercâmbio que torna as coisas saudáveis, por oposição à falta de contacto entre até dentro do próprio país. Acho que se não tivermos cuidado, facilmente a FPS se desmoronará como um castelo de cartas ao vento. E as coisas não podem passar pelos esforços de dois ou três, como até então se tem passado, mas tem de haver uma desmultiplicação desta estrutura federativa, criando-se bases sólidas para um funcionamento saudável desta "máquina". Só assim funcionará.

Dirão os mais críticos que é muito fácil falar estando de fora como estou. Afinal é isso mesmo, eu não estou a participar activamente na Federação. Não tanto quanto gostaria. Mas também a minha ideia é analisar as coisas que não correram bem para podermos melhorar. Portanto gostaria que isto fosse uma crítica construtiva. Perceber as razões e tomar medidas para melhorar o que temos. Pela minha parte e pelo que me foi possível fazer, apoiei a minha irmã nos mundiais e ouvi as palavras provindas da experiência de Joel Dhumez, pedindo-lhe conselhos.

A todos os que se derem ao trabalho de ler esta extensa exposição de factos, faço saber que estou ao dispor para a discussão de ideias, de forma construtiva. Peço ainda que me corrijam se enunciei alguma coisa menos correcta, situação que lamento desde já.

4 comentários:

Anónimo disse...

Ola Marcelo,eu ja tinha publicado no blog de Felgueiras que os atletas de Felgueiras nao podiam participar no campeonato nacional de savate derivado a certas lesões,
quanto a mim ja tinha dito ao Alvaro em novembro de 2007 no campeonato deuropa na Belgica que era a minha despedida das competições portanto da minha parte foi dito a tempo e horas que nao iria participar no campeonato do mundo.
Fiquei com pena de não ter avido campeonato nacional, e nem campeonato de iniciados como tinha sido programado numa reunião da federação em Ovar,falou-se la de muita coisa e nada foi concluido fico triste por isso paciencia
Paulo Silva FLG...

Marcelo Flores disse...

Olá Paulo e obrigado por teres lido e comentado o meu texto. Com efeito, é esta falta de comunicação e de acção que acaba por nos afectar a todos. Realmente não consultei o teu blog mas assim que li o teu comentário, vi que a 14 de Junho tinhas mencionado que os teus atletas estavam lesionados e não participariam no nacional. Um dos problemas reside no incumprimento da programação estabelecida na dita reunião da Federação em Ovar.
É contra isto que me insurjo, contra esta indiferença.
Pela minha parte, mais uma vez te agradeço o teres participado na discussão. Um abraço.

Savate in Brazil disse...

Oi Marcelo, não te conheço e talves voce estranhe minha escrita, é por que sou brasileiro, e o portugues escrito é um pouco difrente mesmo. Bem, li sua exposição quanto aos problemas em questão, e de certa forma temos algumas dificuldades aqui no Brasil semelhantes, estamos reformulando toda a Savate aqui no País, e isso tem nos causado alguns transtornos. O que quero na verdade, e lhe mostrar, que exatamente por ser amador, passamos por essas dificuldades, mas nosso amor pelo esporte nos faz lutar sempre. Eu deveria ter ido ao Mundial de Savate Assaut esse ano, mas tive varios problemas, inclusive de falta de competições, mas tive o prazer de ter a delegação francesa aqui, junto ao Joel Dhumez e ao Uber Abelar para um intercambio e um evento de lutas casadas Brasil vs França, onde tive a honra de lutar com Tony Ancelin, que considero um amigo. Enfim, espero ter passado minha solidariedade em dividir nossos problemas, e estou aqui, e ja faço um convite para que venham nos visitar aqui no Brasil e fazer um intercambio. Grande abraço, meu blog é: savateinbrazil.blogspot.com

Anónimo disse...

Olá Marcelo
Fizeste uma análise bastante correcta ao assunto e a solução passará por uma reformulação da própria FPS. Não basta estar criada juridicamente e já haver, felizmente, resultados desportivos bastante positivos.
Vou só dar-te um exemplo:
- A actual estrutura directiva, da qual faço parte, não está eleita de acordo com os estatutos da FPS, logo bloqueia qualquer iniciativa que se queira tomar.
Há bastante trabalho a fazer e quando assim é, normalmente a maioria das pessoas não está disponível porque não é mediático!
Da minha parte já tenho muito trabalho de casa feito para colaborar com a Sara Flores.
Um abraço
Paulo Santos (Solmaia) 08/11/08